quarta-feira, 10 de maio de 2017

20 impressões em dois anos de Buenos Aires


Há algumas semanas meu amigo Marciano me pediu para escrever um post para seu blog de viagens com cinco coisas que todo brasileiro deveria saber antes de vir a Buenos Aires. Eu gostei da metodologia e resolvi fazer no meu também. Esta semana, para comemorar meus dois anos vivendo na capital porteña, decidi escrever não somente cinco, mas 20 curiosidades a respeito da cidade/país e das pessoas daqui. Lembrando, claro, que é apenas a minha percepção da realidade, que pode não ser a mesma de outro brasileiro - ou de um argentino. Ok? Ok.

1 - Sempre dizem que os brasileiros gostam muito de abraçar e beijar as pessoas ao cumprimentá-las, mas deve ser porque não conhecem os argentinos. Na agência onde eu trabalho eu sou sempre uma das primeiras a chegar e até que não estejam todos, é até difícil me concentrar no trabalho. Todos passam cumprimentando com um beijo. Todos os dias. Ah, e nos colegas que trabalham mais perto tem que dar beijo quando vai embora também.

2 - O mesmo acontece quando você está almoçando: todas as pessoas que entram na cozinha ou refeitório vão te dizer “buen provecho” e você tem que responder “Gracias” quando conseguir engolir o que está mastigando.

3 - A entrada para as baladas são baratas e muitas vezes grátis. Ao menos as que eu frequento. Quase nenhuma cobra até certo horário, algumas só precisam que você minta que está na lista e outras exigem uma faladinha com um promoter antes, mas não é nada complicado, eles estão por toda parte, no Facebook também. E se por acaso você tiver que desembolsar uns $150, certamente vão te dar um papéli que vale um drink ou uma cerveja. O que sim vai te arrancar um pedaço é a bebida.

4 - Se entra alguém com preferência no ônibus ou subte e não tem lugar, a própria pessoa ou alguém que está em pé vai dizer “levanta aí pra senhora sentar”. Ah, e crianças têm preferência também. Se entra uma mãe com dois filhos pequenos, melhor ir levantado pros babes sentarem.

5 - Os jornais aqui dão um pouco de vergonha de ser jornalista. O tempo que veículos teoricamente sérios perdem falando de subcelebridades é espantoso e quase tudo é pautado pelas redes sociais. “Cliente de restaurante relata no Facebook abuso sofrido” e pronto, nenhuma perguntinha ao estabelecimento. Sem falar no click bait descarado em todas TODAS as manchetes.

6 - As pessoas estão sempre reclamando que não têm dinheiro, que o salário não chega nem até a metade do mês, que Macri está levando todos à pobreza, mas as fotos das férias são no Marrocos, EUA, México, Brasil ou Colômbia. Aqui simplesmente não existe isso de não viajar (pra bem longe) nas férias.

7 - Aqui você precisa ser muito pobre ou muito mão de vaca (eu sou os dois) para comprar produtos de segunda ou terceira marca no supermercado. Parece que rola um certo orgulho em colocar o macarrão ou o leite mais caro no carrinho.

8 - Por outro lado, e falando principalmente de gente da minha idade, em geral os porteños não se importam tanto com ter carro ou “bens”. Poucos têm veículo próprio e pouquíssimos possuem carteira de motorista. Sem carro, sem carteira. Eles se impressionam quando digo que tenho licença (mesmo sem dirigir há anos e sem nunca ter tido um automóvel). E também não se importam em morar em bairros mais afastados e pouco práticos. Aliás, se você não mora em um desses te consideram “cheto” (riquinho).

9 - Os planos de saúde aqui são excelentes. Eu sei que o meu está entre os melhores, mas em geral nunca vi ninguém reclamando que teve que esperar quatro meses para conseguir uma consulta num dermatologista, que o plano não cobriu algum procedimento ou que ficou três horas apodrecendo na sala de espera quando precisava atendimento de urgência. Muitos dão medicamentos gratuitos aos pacientes ou conseguem descontos generosos.

10 - Falando em saúde, sabe o exame admissional? Esse que no Brasil te aferem a pressão, te fazem cinco perguntas e pronto? Então, aqui ele inclui eletrocardiograma, exame de urina, de sangue, raio x do tórax e um questionário de três páginas.

11 - Em festas de casamento eles costumam fazer algo que chamam de “carnaval carioca”. Não, não tem nada a ver com o Carnaval do Rio. É só uma baguncinha que contempla o uso de acessórios de plástico, máscaras, perucas e músicas estranhas que definitivamente não são samba.

12 - Os elevadores dos edifícios aqui, em geral, não são automáticos. O prédio tem que ser muito novo para que a porta do elevador abra sozinha. Novo mesmo, tipo menos de 15 anos. Caso contrário é você mesmo que tem que abrir as duas portas.

13 - Uma coisa que eu realmente amo aqui são os banheiros e a presença quase obrigatória de uma banheira. E para impedir que o chão se molhe todo, nada de box. Aqui é mais comum usar a clássica cortina de plástico. Ou seja, você não precisa ser necessariamente rico para ter banheira e nem necessariamente pobre para ter uma cortina de plástico.

14 - Chuveiro elétrico é algo que você não encontra por aqui e não sente a menor saudade. Tudo funciona com gás natural, que é mais barato que eletricidade e te proporciona água quentinha em todas as torneiras o dia inteiro e também faz funcionar as “estufas” (aquecedores).

15 - Falando em estufa, é maravilhosa a preparação que existe aqui para o inverno. Muitos edifícios têm calefação central, dessas que aquecem o piso e o teto, e quando não possuem geralmente tem os aquecedores a gás. Nos bares e restaurantes as estufas funcionam inclusive do lado de fora. Ou seja, está fazendo cinco graus, mas você está de boa comendo na calçada, sem casaco.

16 - Aqui eles também comem arroz, não tanto como a gente, mas é mais comum do que se imagina vê-lo como acompanhamento, principalmente quando cozinham em casa. A diferença é modo de fazer. Não sei se é um método utilizado também no Brasil e desconhecido por mim, mas eles cozinham o arroz como se fosse macarrão, até escorrem no final. Fica meio empapado.

17 - Em dois anos aqui já passei por mais situações incômodas em restaurantes que nos últimos dez que morei no Brasil. Coisas como receber o sanduíche de frango sem o frango, ir acompanhada, esperar uma hora e receber só um dos pratos pedidos (o meu, no caso) e ter que comer sozinha até chegar o da outra pessoa, pedir batata frita e receber purê de abóbora e não poder trocar porque “vai demorar muito”. Erros acontecem em todo lugar e esse não é o grande problema. Mas acham que em algum dos casos veio um pedido de desculpas? Isso é artigo de luxo aqui em se tratando de atendimento.

18 - Dizem que há uns anos Buenos Aires era dessas cidades que nunca dormem, e eu fico pensando, como assim ERA? Pra mim ela segue sem dormir. A quantidade de lugares abertos 24 horas ainda me impressiona. Só na zona que compreende três quadras da minha casa tem quiosco, restaurante/café, floricultura e um McDonalds que não fecham jamais. Sem falar nos ônibus, que não param nunca.
19 - A pronúncia de algumas palavras em português ou inglês para eles é muito difícil. O
jota, por exemplo, 99% dos argentinos que conheci não consegue pronunciar. Eu sou a Shuli e pronto. Não adianta passar horas tentando fazê-los perceber que existe uma diferença entre “Juli” e “Shuli”, para eles é o mesmo som, o som de “shota”. É bem engraçado.

20 - É difícil ficar entediado em Buenos Aires e essa é uma das grandes razões de eu ter escolhido a cidade para viver. Não precisa muito dinheiro para sair de casa e se divertir, ver algo diferente, comer comida boa e ter experiências lindas todos os dias.

3 comentários:

  1. Olá, Juliete! Recém li teu post. Morei alguns anos em Buenos Aires(fui embora final de 2011) e estou planejando voltar. Tuas palavras me fizeram entender que estou fazendo o certo. Cada lugar tem suas alegrias e dificuldades, mas o importante é encontrar o teu pedaço de canto no mundo.

    Sucesso, guria!!

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  2. Olá.

    Acabei de conhecer seu blog, nesta madrugada brasileira, através de um tweet do jornalista Ariel Palacios, também residente em terras porterñas como você e que compartilhou com os seguidores dele, este texto tão útil quanto leve.

    Estive em Buenos Aires em duas ocasiões - como turista - mas me senti e me sinto tão em casa quando visito à cidade, que é como se eu estivesse voltando para uma das casas que já morei na minha vida. Essa mesma sensação tenho com São Paulo, cidade que morei durante 1 ano e meio da minha medíocre vida (sim, estou deprimida). Estou com vontade de ir para longe de tudo que envolve meu contexto atual e seu texto me trouxe um alento e um acréscimo na coragem e na força para fazer essas mudanças radicais - pelo menos, geograficamente e antropologicamente radicais.

    Nasci e moro em Salvador (BA), mas meu limite com a cidade extrapolou. Parabéns pela mudança e coragem. É o que preciso colocar em prática.

    Você tem algum e-mail específico que você disponibiliza para seus leitores entrar em contato com você? Se fosse possível, gostaria de conversar mais com você sobre essa realidade de morar na Argentina, mas especificamente, em Buenos Aires.

    Abraço e sucesso sempre na sua jornada.

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  3. Olá, Juliete.

    Fiz um comentário sobre seu texto e como de praxe estou aguardando a aprovação para a publicação do mesmo. Fui informada que meu e-mail está cancelado para comentários neste post. Não entendi bem isso. De qualquer forma, espero que chegue até você o texto que escrevi comentando sua decisão de ir morar em Buenos Aires.

    Até mais.

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